15 maio, 2010

"Palestina" de Mahmud Darwish

só me resta
perder-me pela tua sombra, que é a minha.
só me resta
habitar a tua voz, que é a minha.

afastei-me da cruz estendida
como claridade em horizonte que não se inclina
até ao mais minúsculo monte que a vista alcança
mas não achei minha ferida, minha liberdade.

porque não sei onde moras
não encontro o caminho,
e porque meu dorso não se apoia em ti com pregos
inclinei-me tanto
como teus céus fazem
a quem espreita de escotilhas de avião

devolve-me os pedaços do meu nome
para que possa convocar as fibras das árvores
devolve-me as letras do meu rosto
para que possa chamar as tempestades próximas
devolve-me as razões do meu prazer
para que possa invocar esse regresso sem razão

porque a minha voz está seca como pau de bandeira
e a minha mão vazia como o hino nacional
porque a minha sombra é ampla como se fora uma festa
e os traços do meu rosto se passeiam de ambulância,
porque eu não sou mais do que isto:
o cidadão de um reino que não nasceu ainda.

Mahmud Darwish (Palestina, 1942) - Tradução de Adalberto Alves.
In. “Palestina: A saga de um Povo”, Al-Khudayri, Tariq, Hugin Editores, 2002.

Sem comentários: