06 junho, 2009

Discurso no Cairo de Barak Obama (trecho sobre a Palestina)

Decidimos transcrever, na sua totalidade, a parte do discurso de Barack Obama que se refere à questão palestina, porque entendemos que é importante conhecer o que ele nos disse na globalidade para além das referências parcelares já publicadas pelos órgãos de comunicação social.

Assim que possível publicaremos o discurso total, já que este foi desde logo um marco definitivo nos caminhos para a paz e segurança no Médio Oriente.

"...
A segunda grande fonte de tensão que temos de discutir é a situação entre israelitas, palestinos e o mundo árabe.

Os estreitos laços dos Estados Unidos e Israel são bem conhecidas. Esta ligação é inquebrável. Baseia-se em laços históricos e culturais, bem como no reconhecimento de que a aspiração por uma Pátria judia está enraizada numa trágica história, que não pode ser negada.

Em todo o mundo, os judeus foram perseguidos durante séculos, e o anti-semitismo na Europa levou a algo nunca visto: o Holocausto. Amanhã, visitarei Buchenwald, que fez parte de uma série de campos onde os judeus foram escravizados, torturados, baleados e gaseados até à morte pelo Terceiro Reich. Seis milhões de judeus foram aniquilados, mais do que toda a actual população judaica de Israel. Negar essa realidade é ilegítimo, é ignorante e é odioso. Ameaçar Israel com a destruição - ou repetir estereótipos abjectos sobre os judeus - é profundamente errado e só servem para suscitar nos israelitas as mais dolorosas memórias e, ao mesmo tempo, impedir a paz que os povos da região merecem.

Por outro lado, também é inegável que o povo palestiniano - muçulmanos e cristãos - também sofreu na busca por uma pátria. Durante mais de sessenta anos, sofreu a dor de estarem desalojados. Muitos aguardam em campos de refugiados na Cisjordânia, Gaza e em terras vizinhas, uma vida de paz e segurança que nunca conseguiram ter. Sofreram humilhações quotidianas - grandes e pequenas - decorrentes da ocupação. Então, que não haja dúvidas: A situação para o povo palestino é intolerável. E os Estados Unidos não vão voltar as costas às legítimas aspirações palestinas de dignidade, oportunidade e de um estado seu.

Durante décadas, tem existido um impasse: dois povos com legítimas aspirações, cada um com uma dolorosa história, o que torna os compromissos difíceis. É fácil atribuir a culpa – para os palestinos a deslocação, como resultado da fundação de Israel, e para os israelitas a constante hostilidade e os ataques realizados, ao longo da sua história, dentro e fora das suas fronteiras. Mas se olharmos o conflito a partir de apenas um dos lados ou do outro, então estaremos cegos à verdade: a única solução para as aspirações de ambas as partes será encontrada através de dois estados, em que israelitas e palestinos vivam em paz e a segurança.

É do interesse de Israel, é do interesse da Palestina, é do interesse dos Estados Unidos e do interesse do mundo inteiro. É por isso que eu pretendo prosseguir pessoalmente este resultado com toda a paciência e dedicação que a tarefa exige. As obrigações – as obrigações que as partes acordaram no Roteiro são claras. Para alcançar a paz, é tempo para eles - e para todos nós – cumprirmos com as nossas responsabilidades.

Os palestinos devem desistir da violência. A resistência através da violência e da matança é errado e não terá êxito. Durante séculos, os negros nos Estados Unidos sofreram o açoite do chicote como escravos e a humilhação da segregação. Mas não foi a violência que conquistou a plena igualdade de direitos. Foi uma pacífica e resoluta perseverança nos ideais centrais dos fundamentos dos Estados Unidos. A mesma história pode ser contada pelos povos da África do Sul ao Sul da Ásia; da Europa Oriental à Indonésia. É uma história com uma verdade muito simples: que a violência é um beco sem saída. Não é sinal nem de coragem nem de força lançar foguetes contra crianças dormindo, ou fazer explodir velhotas num autocarro. Não é assim que se reivindica a autoridade moral; é assim que a ela se renúncia.

Este é o momento em que os palestinos se deveriam concentrar naquilo que podem construir. A Autoridade Palestiniana deverá desenvolver a sua capacidade de governar, com instituições que respondam às necessidades de seu povo. O Hamas tem apoio entre alguns palestinos, mas também tem de reconhecer que tem responsabilidades. Para desempenhar um papel na realização das aspirações dos palestinos, para unir o povo palestino, o Hamas tem de pôr um fim à violência, reconhecer acordos passados e reconhecer o direito de Israel a existir.

Ao mesmo tempo, Israel deve reconhecer que, tal como não lhe pode ser negado o direito de existir, o mesmo se deve aplicar à Palestina. Os Estados Unidos não aceitam a legitimidade da contínua colonização israelita. Esta actividade viola acordos anteriores e compromete os esforços para alcançar a paz. É tempo para essa colonização parar.

E Israel também tem de cumprir as suas obrigações para garantir que os palestinos possam viver, trabalhar e desenvolver a sua sociedade. Da mesma maneira que é devastador para as famílias palestinas, a continuidade da crise humanitária na Faixa de Gaza, esta não contribui para a segurança de Israel; nem de igual modo, a continuada a falta de oportunidades na Cisjordânia. Os progressos na vida quotidiana do povo palestino devem ser uma parte crítica do caminho para a paz, e Israel deve tomar medidas concretas para permitir esse avanço.

Por último, os Estados árabes devem reconhecer que a Iniciativa Árabe de Paz foi um importante ponto de partida, mas não o fim das suas responsabilidades. O conflito árabo-israelita não deveria ser usado para distrair as pessoas dos países árabes da existência de outros problemas. Pelo contrário, deve ser uma razão para agir ajudando o povo palestino a desenvolver as instituições que irão suster o seu Estado, reconhecendo a legitimidade de Israel, e escolhendo o progresso e não uma contraproducente concentração sobre o passado.

Os Estados Unidos irão alinhar as suas políticas, com aqueles que procuram a paz, e devemos dizer em público aquilo que dizemos em privado aos israelitas, aos palestinianos e aos árabes. Não podemos impor a paz. Mas, privadamente, muitos muçulmanos reconhecem que Israel não vai desaparecer. Da mesma forma que muitos israelitas reconhecem a necessidade de um Estado palestino. É tempo de agirmos com base naquilo que todos sabemos que é verdade.

Demasiadas lágrimas têm sido derramadas. Demasiado sangue foi derramado. Todos temos a responsabilidade de trabalhar para o dia em que as mães dos israelitas e dos palestinos possam ver seus filhos crescer sem medo; quando a Terra Santa das três grandes religiões for o lugar de paz que Deus planeou que fosse; quando Jerusalém for um seguro e duradouro lar para Judeus, Cristãos e Muçulmanos e um lugar onde todos os filhos de Abraão confraternizem pacificamente como na história da Isra [1], quando Moisés, Jesus e Maomé, que a paz esteja com eles, se juntaram para rezar.
…”
[1] A Isra, viagem nocturna, refere-se à viagem que, numa só noite, o profeta Maomé realizou de Meca a Jerusalém e depois ao paraíso e aos infernos.

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