Os sublinhados e o título são de minha responsabilidade. A tradução é de Caia Fittipaldi, de quem se manteve a norma de escrita.
O presidente Barack Obama dos EUA enfrentou aguda queda em sua popularidade no mundo árabe ao longo do último ano. O Irã pode estar-se beneficiando dessa queda, segundo resultados de grande pesquisa de opinião pública em cinco países árabes.
Apenas 20% dos respondentes no Egito, Jordânia, Líbano, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos veem hoje positivamente o presidente norte-americano, contra os 45% da primavera de 2009, segundo a Pesquisa de Opinião Pública Árabe 2010 [2010 Arab Public Opinion Poll: Results of Arab Opinion Survey] realizada entre 29 de Junho e 20 de Julho,deste ano por Shibley Telhami da Brookings Institution associada à empresa de pesquisas Zogby International.
Sinal ainda pior, a opinião negativa sobre Obama subiu à estratosfera – saltou de 23% para 62% – desde a última pesquisa, feita em abril-maio 2009. Os novos números são compilação das respostas obtidas de cerca de 4 mil adultos nos seis países, entre 29 de junho e 20 de julho de 2010.
Convidados a citar o líder mundial que mais admiram, o nome de Obama só foi lembrado por menos de 1% dos respondentes. O presidente da Turquia Recep Tayyip Erdogan foi lembrado por 20%, seguido do campeão da pesquisa anterior, o presidente venezuelano Hugo Chávez (13%) e do presidente do Irã Mahmud Ahmadinejad (12%).
A rápida ascensão de Erdogan – ano passado foi citado por apenas 4% dos entrevistados e não apareceu na pesquisa de 2008 – explica-se pela empenhada manifestação contra os ataques israelenses a Gaza em 2008-9 e pelo papel da Turquia no episódio do ataque também por Israel contra a Flotilha da Paz, no final de maio, conforme análise de Telhami.
Muito da desilusão com Obama parece relacionada ao nenhum progresso no processo de alcançar um acordo de paz entre israelenses e palestinos, segundo Telhami, que já coordenou oito pesquisas anteriores no mesmo universo desde 2000.
Perguntados sobre qual das políticas de Obama mais os havia desapontado, 61% dos respondentes na pesquisa de 2010 apontaram o conflito Israel-Palestina. É mais que o dobro da porcentagem da segunda política citada como decepcionante: a política de Washington para o Irã (27%).
“Os árabes avaliam os EUA por esse prisma”, disse Telhami, referindo-se ao conflito Israel-Palestina.
Outra das evidências que a pesquisa trouxe à tona é que o Irã parece estar-se beneficiando, pelo menos indiretamente, da desilusão dos árabes em relação a Obama.
Embora a maioria dos respondentes (55%) diga que acredita que o programa nuclear de Teerã vise a desenvolver armas – acusação negada pelo Irã –, praticamente quatro de cada cinco respondentes (77%) afirmam que o país tem direito de dar andamento ao seu próprio programa nuclear, com aumento de 24% nessa faixa de opinião em relação à pesquisa do ano passado.
O apoio ao programa nuclear iraniano foi acentuadamente maior no Egito e no Marrocos; e mais fraco nos Emirados Árabes Unidos, onde expressiva maioria entende que o Irã deva ser pressionado a desistir do programa.
Correspondentemente, apenas 20% dos respondentes dizem concordar com que se apliquem sanções e pressões de qualquer tipo para forçar o Irã a cancelar seu programa nuclear. Ano passado, 40% dos respondentes eram favoráveis a sanções e pressão contra o Irã.
“O mais importante é que a pesquisa mostra claramente que é falso que os árabes desejem secretamente que os EUA ataquem o Irã” – escreveu Marc Lynch, especialista em Oriente Médio da George Washington University, cujo blog em foreignpolicy.com é muito lido nos meios acadêmicos e políticos.
Uma sólida maioria (57%) dos respondentes concordam com a ideia de que, se o Irã construir armas nucleares, poderá haver “desenvolvimentos mais positivos” no Oriente Médio. É quase o dobro da porcentagem de há um ano (29%). E apenas 21% concordam com a ideia oposta, de que poderá haver “desenvolvimentos mais negativos” (em 2009, foram 46%).
Esses resultados, disse Telhami, “confirmam as demais respostas. Há alta correlação positiva entre essas respostas e o que os respondentes dizem sentir em relação à política dos EUA. De fato, o que se vê aí é, sobretudo, expressão da ira e do pessimismo que os entrevistados sentem em relação à política dos EUA para o Irã.”
Falando em auditório completamente lotado na Brookings, Telhami destacou que o mundo árabe, diferente nisso de outras regiões-chave, jamais “viveu lua de mel de amores por Obama”, mas sua eleição fez aumentar, sim, as esperanças, sobretudo depois dos oito anos de governo de George W Bush, presidente que, ao lado dos primeiros-ministros israelenses Ariel Sharon e Ehud Olmert sempre foram os líderes globais mais detestados no mundo árabe, nas pesquisas de Telhami.
Depois do Discurso do Cairo, dia 4/6/2009, as esperanças em Obama subiram, no mundo árabe. Naquele discurso Obama disse que estaria à procura de “um novo começo” nas relações entre os EUA e o mundo islâmico e mostrou-se particularmente empático com o sofrimento dos palestinos, sobretudo em Gaza.
Aquelas esperanças parecem ter-se evanescido ao longo do último ano, conforme mostram os dados da pesquisa. Embora Obama ainda seja figura atraente para muitos árabes – 48% dos respondentes declararam ter dele opinião pessoal favorável –, uma amplíssima maioria (89%) declarou ter certeza de que Obama não mudará ou não conseguirá mudar as políticas básicas dos EUA no Oriente Médio.
Num dos achados mais notáveis da pesquisa, apenas 12% dos respondentes disseram que tem opinião favorável sobre os EUA. São 3 pontos percentuais a menos, em relação à pesquisa de 2008, ainda na presidência de Bush. Ao mesmo tempo, a pesquisa mostra queda significativa nos que declararam ter “opinião muito desfavorável” sobre os EUA: de 64% em 2008, para 47% na última pesquisa.
À pergunta sobre quais dois passos Washington poderia tomar e que mais fariam melhorar a imagem dos EUA, a maioria das respostas foi: conseguir um acordo de paz entre israelenses e palestinos; retirar-se do Iraque; suspender completamente qualquer ajuda a Israel; e retirar-se da Península Árabe, nessa ordem. “Promover a democracia” e “ajuda econômica”, itens também apresentados, foram escolhidos por número muito menor de respondentes.
Perguntados sobre os dois fatores que considerassem mais importantes como determinantes das políticas dos EUA para o Oriente Médio, o item “proteger Israel” foi o mais citado, seguido de “controlar o petróleo”, “enfraquecer o mundo muçulmano” e “defender a dominação regional e global”, nessa ordem. “Evitar a proliferação nuclear”, “combater o terrorismo” e “promover direitos humanos e democracia”, itens também apresentados, foram escolhidos por número muito menor de respondentes.
Perguntados sobre os dois países que considerassem como maior ameaça pessoal a cada um dos respondentes, “Israel” apareceu em primeiro lutar nas respostas (88%), seguido de “EUA” (77%) – exatamente os mesmos números da pesquisa de 2009. Ainda durante a presidência de Bush, 95% dos respondentes citaram Israel; e 88%, os EUA. Na outra ponta da lista, o Irã foi citado por apenas 10% dos respondentes em 2010, menos que os 13% do ano passado.
Quanto a Israel, a nova pesquisa constatou significativo aumento na ideia de que o Estado judeu está exercendo influência mais poderosa sobre os EUA do que os EUA sobre Israel.
Perguntados sobre o que motivaria as políticas israelenses e o apoio que recebem dos EUA, 47% responderam que lhes parece que “Israel decide o que lhes interessa e influencia os EUA”; há dois anos, apenas 24% escolheram essa alternativa de resposta. E 20% responderam que lhes parece que “Israel é uma ferramenta da política externa dos EUA”. 33% concordam que “EUA e Israel têm interesses comuns”.
O pessimismo em relação a um acordo de paz duradouro entre israelenses e palestinos no médio prazo também aumentou nos últimos dois anos. Ao mesmo tempo, 40% entendem que acordo desse tipo seria “inevitável” e apenas 4% dizem que acreditam que possa acontecer nos próximos cinco anos: bem menos que os 13%, de 2008. Uma maioria de 54% declarou que não acredita que acordo desse tipo aconteça algum dia.
Quanto à opinião sobre alguma paz duradoura, um total recorde de 86% dos respondentes declararam que estão preparados para um acordo de paz, dependendo apenas de Israel aceitar devolver aos palestinos todos os territórios que capturaram na guerra de 1967, inclusive Jerusalém Leste. Mas, na opinião de 56% dos respondentes, “Israel não devolverá facilmente aqueles territórios.”
Para 12%, os árabes devem continuar a lutar contra Israel, mesmo que Israel aceite devolver os territórios ocupados. Ano passado, essa era a posição de 25% dos entrevistados.
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