06 agosto, 2010

A cerimónia do 65.º aniversário do lançamento da primeira bomba atómica e a indelicadeza do embaixador dos EUA

Pedindo o fim das armas nucleares, a cidade japonesa de Hiroshima lembrou nesta sexta-feira o 65º aniversário do lançamento da primeira bomba atómica, numa cerimónia que, pela primeira vez, teve participação oficial de algumas das potências nucleares, China, Estados Unidos, França e Reino Unido e ainda de um secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), neste caso, Ban Ki-moon.

Estiveram ainda presentes outros diplomatas representando 70 países.

Às 8h15 locais, exactamente a mesma hora em que o avião americano Enola Gay lançou a bomba atómica em 1945, as 55 mil pessoas que, segundo a agência local Kyodo, se reuniram no parque da Paz de Hiroshima, fizeram silêncio.

O parque ocupa a esplanada deixada pela detonação da bomba de urânio Little Boy, que arrasou Hiroshima, cidade que contava então com cerca de 350 mil habitantes, segundo cálculos actuais.

Cerca de 80 mil pessoas morreram de imediato, e até ao fim de 1945, o número de mortes já chegava às 140 mil. Ao longo dos anos muito mais pessoas morreram precocemente devido aos efeitos da radiação.

Três dias depois deste ataque, os EUA lançaram uma segunda bomba nuclear, agora de plutónio, sobre a cidade de Nagasaki, causando 74 mil mortes até o final daquele ano, levando o Japão à rendição e colocando assim fim à Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Na cerimónia que marcou os 65 anos da tragédia, o prefeito de Hiroshima, Tadatoshi Akiba, pediu para o Japão abandonar o "guarda-chuva nuclear" dos EUA, país que após a Segunda Guerra Mundial se tornou o seu principal aliado.

Diante de um público que incluía o primeiro-ministro do Japão, Naoto Kan, Akiba prestou homenagem aos mortos e aos hibakusha, (literalmente "pessoa afectada pela explosão") como são conhecidos os sobreviventes do desastre atómico, que "sem entender a razão, se viram envolvidos num inferno, para além de seus piores pesadelos".

O pedido do prefeito teve pronta resposta do primeiro-ministro do Japão, que após a cerimónia afirmou que a protecção nuclear dos EUA "continua sendo necessária" para o Japão, embora ao mesmo tempo tenha assegurado que o país tem a responsabilidade moral de liderar a luta contra as armas atómicas.

O embaixador americano compareceu "para expressar respeito por todas as vítimas da Segunda Guerra Mundial", segundo comunicado da delegação diplomática em Tóquio, que destacou que os EUA e o Japão "compartilham o objectivo comum de avançar na visão do presidente Obama de conseguir um mundo sem armas nucleares".

A participação do embaixador dos EUA tinha suscitado grandes expectativas, que esperava alguma indicação sobre uma visita à cidade do presidente americano, Barack Obama, em Novembro, aquando da sua programada deslocação ao Japão.

No entanto, um porta-voz da Casa Branca afirmou nesta sexta-feira que, por enquanto, uma visita à cidade, que os EUA arrasaram em 1945, não está nos planos do presidente americano.

Ou seja o Senhor Embaixador dos EUA, John Roos, foi a uma cerimónia onde se prestava homenagem às vítimas do primeiro bombardeamento nuclear da história para, mais tarde e por comunicado, lhe tentar retirar significado e fazer propaganda do seu governo, que no entanto continua incapaz de assumir perante o seu aliado, o Japão, a responsabilidade do massacre e sofrimento de milhares de civis. Para fazer tal figura...

O secretário-geral da ONU, por seu lado, reiterou o seu compromisso com a abolição das armas atómicas, e mostrou a sua esperança de poder celebrar em 2020 a existência de um mundo sem ameaças nucleares.

Ban propôs fixar 2012 como o ano de entrada em vigor do Tratado para a Proibição de Testes Nucleares (CTBT), assinado em 1996, mas que continua à espera da ratificação de 44 nações, entre elas Estados Unidos e China.

O alto representante para Desarmamento, Sérgio Duarte, declarou à Rádio ONU, que:

"O Secretário-Geral fez um discurso de esperança, de futuro, de paz. Esta foi a mensagem que ele quis deixar aqui. Foi a primeira vez que um secretário-geral participou na cerimónia. Foi um gesto simbólico muito importante."

Sérgio Duarte afirmou ainda que o testemunho dos hibakusha é importante para que um ataque como este jamais se repita.

"Hoje, a média de idade dos hibakusha é de 77 anos. Em breve, eles desaparecerão. O que é preciso é que a memória deles, e o sofrimento deles ao longo da vida com os efeitos da radiação e dos problemas físicos que tiveram, sejam lembrados para que as gerações futuras saibam que a bomba é um instrumento desumano, que mata indiscriminadamente", concluiu.

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